Em junho de 2025, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) publicou a Portaria nº 15/2025, regulamentando oficialmente o reconhecimento da chamada distintividade adquirida, também conhecida como secondary meaning. Essa normativa marca um importante avanço na proteção de sinais que, embora inicialmente considerados genéricos, descritivos ou evocativos, tornaram-se distintivos por força do uso contínuo e substancial no mercado.
No campo do direito marcário, a distintividade é um requisito essencial para a concessão do registro de uma marca. É por meio dela que o consumidor consegue identificar a origem empresarial de produtos ou serviços e distingui-los de seus concorrentes. No entanto, nem todo sinal nasce distintivo. Muitas marcas são formadas por termos do vocabulário comum ou por expressões que descrevem diretamente as características do produto ou serviço que identificam, o que, à luz da legislação, as torna inicialmente irregistráveis.
O fenômeno do secondary meaning surge exatamente como uma exceção a essa regra. Quando um sinal que não possui distintividade intrínseca passa a ser amplamente reconhecido pelo público consumidor como um indicativo de origem empresarial específica em razão de seu uso constante, exclusivo e de forte presença no mercado.
Esse sinal adquire capacidade distintiva e, consequentemente, torna-se apto ao registro. Trata-se de um reconhecimento de que o consumidor atribui àquela marca um significado secundário, que prevalece sobre o sentido original e descritivo do sinal.
O conceito não é novo no cenário jurídico internacional, sendo amplamente adotado por jurisdições como os Estados Unidos e a União Europeia. No Brasil, embora amplamente reconhecido pela doutrina e jurisprudência, o secondary meaning carecia de regulamentação formal por parte do INPI, o que frequentemente gerava insegurança jurídica e indeferimentos automáticos de pedidos. A nova Portaria, nesse sentido, preenche uma lacuna histórica e cria um caminho mais claro e transparente para o reconhecimento dessas marcas pelo Instituto.
O requerimento de análise da distintividade adquirida poderá ser feito no momento do depósito da marca, ou em até 60 dias após a publicação do pedido de registro, em manifestação sobre impugnação de terceiros (manifestação à oposição ou à nulidade), ou no ato de interposição de recurso contra o indeferimento por ausência de distintividade. Para os processos em andamento que já tenham ultrapassado essas fases, o titular ainda poderá apresentar o requerimento dentro de um prazo extraordinário de 12 meses, contados a partir da vigência da nova portaria, qual seja, 28 de novembro de 2025.
Para tanto, o titular deverá comprovar que a marca foi utilizada de forma contínua e substancialmente exclusiva nos três anos que antecedem o pedido, devendo apresentar provas de que o público reconhece aquele sinal como distintivo da origem empresarial de seus produtos ou serviços. Também é exigido o histórico de investimentos realizados em campanhas publicitárias e promocionais, demonstrando o esforço deliberado e estratégico do titular para construir valor e reconhecimento em torno da marca.
Essas provas devem ter caráter nacional, evidenciando que a distintividade foi adquirida em todas as regiões do país. Além disso, é necessário que estejam relacionadas aos produtos ou serviços reivindicados no pedido de registro, e que se refiram à forma exata da marca cujo reconhecimento se pretende obter. Podem ser utilizados, por exemplo, materiais de marketing, matérias jornalísticas, pesquisas de mercado, declarações de entidades de classe, premiações, dentre outros documentos que atestem a reputação da marca perante o público.
Vale destacar que o reconhecimento da distintividade adquirida pode ser limitado aos produtos e serviços para os quais houver prova efetiva. Ou seja, o INPI poderá deferir parcialmente o pedido, restringindo o alcance do registro conforme os elementos apresentados. O objetivo é assegurar que apenas sinais que, de fato, tenham superado a barreira da ausência de distintividade por força de seu uso, possam fruir da proteção conferida pelo registro marcário.
A medida representa um avanço importante para o sistema de marcas brasileiro, pois valoriza o esforço das empresas na construção e consolidação de seus sinais no mercado. Além disso, fortalece a segurança jurídica dos titulares e contribui para o combate à concorrência desleal, impedindo que terceiros se apropriem indevidamente de signos que já possuem clara associação com determinada empresa.
Em síntese, a regulamentação da distintividade adquirida amplia o alcance da proteção marcária no Brasil e aproxima o país de práticas já consolidadas em sistemas internacionais. Com a sua entrada em vigor, o INPI passará a reconhecer formalmente que a percepção do público consumidor é um requisito importante na análise de registro de marca, considerando a dinâmica real do mercado e o valor que os sinais comerciais conquistam ao longo do tempo.
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Autoras:
Hellen Pessanha
Lorrane Leal
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