#Dispute Resolution

Ministro do STJ assume posição polêmica sobre a produção de provas de ofício.

27/5/25
Superior Tribunal de Justiça - STJ

Não é de hoje que se discute sobre os poderes instrutórios do juiz no processo civil.1 A concepção publicista, que garante maior amplitude de atuação ao magistrado, já está presente no modelo processual brasileiro pelo menos desde o CPC/39.

Apesar das diversas objeções, principalmente pela suposta ameaça à imparcialidade do magistrado, fato é que o CPC/2015 manteve a possibilidade de produção de prova de ofício no art. 370, que prevê o seguinte: “Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito.”2

O código, no entanto, silencia em relação às hipóteses em que o juiz deverá se utilizar de suas prerrogativas instrutórias. As partes, por sua vez, ficam sujeitas a uma sistemática cuja previsibilidade é muito precária.

É por essa razão que alguns processualistas passaram a considerar que o juiz não possui um poder instrutório, mas sim um dever instrutório.3 Quer dizer, uma vez identificada a necessidade de produção de uma prova que contribuirá para discernir qual das partes tem razão, impõe-se ao magistrado o dever de produzi-la.

Mas mesmo diante dessa compreensão, continuam a surgir dúvidas interpretativas.

Recentemente, o STJ foi chamado a se manifestar sobre o assunto no REsp 1853364. Iniciado em 1998 em face do Itaú, o processo discute o ressarcimento de danos estimados em 144 milhões de reais.

Naquele caso, os autores haviam pedido julgamento antecipado do processo, renunciando à produção probatória, e tiveram resultado favorável na primeira instância. No Tribunal, porém, a sentença foi parcialmente reformada, sob o argumento de que a perícia, essencial para a definição dos danos materiais, não havia sido produzida.

Chegou ao STJ, então, ação rescisória que veicula a seguinte controvérsia: o Tribunal poderia ter julgado sem a prova ou deveria ter determinado a produção da perícia? Ou seja, houve cerceamento de defesa dos autores?

O Min. Marco Aurélio Belizze, relator do caso, votou no sentido de rejeitar a tese dos autores. Para ele, não houve cerceamento de defesa uma vez que os próprios autores optaram por renunciar à produção da prova no primeiro grau.

O Min. Humberto Martins, no entanto, apresentou voto divergente, reconhecendo erro processual do Tribunal ao não ter oferecido a oportunidade para realização da perícia. Votou, portanto, no sentido de acolher a tese dos autores para reabrir a fase instrutória daquela ação.

Confira-se o recorte da sessão que apresenta o voto do Min. Humberto Martins (fonte: Migalhas):4 https://www.youtube.com/watch?v=jyL2Ig0tlKE&t=282s

O objetivo do presente artigo não é expor motivos para defender uma ou outra concepção. Pretende-se tão somente chamar atenção para a incerteza que existe hoje em relação ao poder-dever instrutório do magistrado e como é importante que o advogado saiba lidar com essa incerteza.

O que podia parecer uma causa perdida, foi visto como uma oportunidade pelo advogado que deu início à ação rescisória. Apesar da tese ousada, o STJ já se mostrou inclinado a concordar com o posicionamento.

Isso significa que mesmo os casos mais espinhosos, quando analisados com um olhar estratégico, podem apresentar alternativas viáveis. Tudo dependerá da aplicação da técnica adequada, que exige conhecimento e preparo.

Notas:

1 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1994

2 Sobre a ausência de prejuízo à imparcialidade, v. BARBOSA MOREIRA, José Carlos. O neoprivatismo no processo civil. Temas de Direito Processual (nona série). São Paulo: Saraiva, 2007, p. 96.

3 RAMINA DE LUCCA, Rodrigo. Disponibilidade processual: a liberdade das partes no processo. 1. ed. São Paulo: Thomson Reuters, 2019. [e-book] RB-1.18.

4 https://www.migalhas.com.br/quentes/430762/stj-analisa-cerceamento-de-defesa-em-acao-milionaria-contra-o-itau

▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔▔

Autor:

Tiago Andrade

Créditos da Imagem: Superior Tribunal de Justiça STJ

Compartilhe esse artigo em suas redes sociais: