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Cláusulas de Clawback

11/3/24
Duas pessoas em um ambiente de escritório. Uma delas está segurando uma caneta e escrevendo em um documento que está sobre uma mesa de madeira escura.

1. DEFINIÇÃO

A cláusula de clawback, também conhecida como “cláusula de reversão” é uma disposição, opcional, dos contratos de trabalho ou acordos de compensação dos executivos da administração, de forma a proteger os interesses das empresas.

Referida cláusula proporciona ao empregador mecanismos para recuperar bônus e/ou remunerações financeiras recebidos antecipadamente pagos aos executivos em caso de retificação de demonstrações financeiras, práticas antiéticas, violações às políticas da empresa, não permanência na empresa pelo tempo combinado.

2. CENÁRIO GERAL

Após a crise de 2008, um número crescente de empresas americanas passou a incluir nos contratos com seus executivos mecanismos de clawback, tendo tal tema adquirido tamanha relevância que em outubro de 2022 foi publicada pela Securities and Exchange Comission, a Final Rules of Listing Standards for Recovery of Erroneously Awarded Compensation, disciplinando sobre as regras e procedimentos mínimos a serem observados por todas as empresas listadas em bolsa americana, as quais devem passar a contar com uma Política de Clawback.

Dessa forma, diversas empresas brasileiras com valores mobiliários listados nos Estados Unidos passaram a ser obrigadas a deter Política de Clawback, a qual passou a ser aplicável inclusive para empregados que trabalham e residem no Brasil, suscitando discussão sobre as leis brasileiras que incidem sob este tema.

3. TRATAMENTO JURÍDICO NO BRASIL

No Brasil, não há legislação específica que discipline o instituto do clawback, sendo o Projeto de Lei nº 866/2019 - que visa alterar dispositivos da Lei Anticorrupção para prever a restituição de incentivos financeiros devidos ou pagos a dirigentes e administradores, em caso de atos cometidos contra a administração pública - pioneiro em legislar sobre o assunto.

Diante de um cenário de ausência de lei específica sobre o assunto, predomina o entendimento de que não há vedação à possibilidade de inclusão de cláusulas de clawback em contratos de trabalho dos executivos, desde que estes possuam diploma de nível superior e que percebam salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social1, ou seja, que sejam considerados hipersuficientes, condição que permite a “livre estipulação” das cláusulas contratuais que não sejam atreladas a direitos irrenunciáveis.

O entendimento acima destacado decorre de alterações trazidas pela Reforma Trabalhista de 2017 e, portanto, ainda não há jurisprudência assentada sobre a matéria. Apesar disso, já há julgados reconhecendo a liberdade das partes em prever cláusulas de clawback nos contratos de trabalho e, reconhecendo a validade jurídica do instituto.

Nesse sentido, o TST já reconheceu que "é lícita a cláusula que prevê a perda de “ações fantasmas” (unidades monetárias de incentivo) pelo empregado que pedir demissão antes de decorrido o prazo de carência (“vesting”)" (ARR-2843-80.2011.5.02.0030, Relatora Ministra: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, Data de Julgamento: 18/11/2015, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 20/11/2015).

No caso acima citado, a 8ª turma do TST considerou “lícita a cláusula que prevê a perda de "ações fantasmas" (ações de incentivo, um tipo de bônus) pelo empregado que pede demissão antes de decorrido o prazo de carência de três anos fixado pelo regulamento do Banco de Investimentos Credit Suisse (Brasil) S. A."

Assim, a mais alta Corte Trabalhista entendeu que o plano de ações é mera liberalidade a favor do empregado, cuja aquisição foi condicionada à sua permanência na empresa pelo período de carência. No caso, o empregado decidiu romper o vínculo empregatício antes do prazo mínimo estipulado pela livre vontade das Partes.

Portanto, a cláusula clawback é aceita pela jurisprudência trabalhista, desde que estipulada com determinados trabalhadores, os quais possuam condições de negociar as condições contratuais. Sem prejuízo, importante ressalvar que a despeito da hipersuficiência do trabalhador, alguns requisitos devem ser observados, com base no princípio da boa-fé negocial. Assim, o prazo de permanência não pode ser estipulado de forma extremamente onerosa, sendo que a prática adotada pelas empresas e usualmente admitida pela jurisprudência é de no máximo 02 (dois anos).

Por fim, quanto à eventual multa pecuniária, esta não poderá exceder o valor da obrigação principal, nos termos do art. 412 do Código Civil.

4. CONTRATO

O contrato de trabalho ou acordo de compensação firmado com o executivo que contenha cláusula de clawback deve ser o mais claro e específico possível. Sendo assim, as hipóteses que possibilitam a empresa acionar o clawback devem ser muito bem delimitadas, de forma a não deixar dúvidas quanto sua aplicabilidade.

Desta forma, a clareza da cláusula de clawback é essencial para evitar discussões sobre sua validade e aplicabilidade jurídica, uma vez que a justiça do trabalho ainda é protecionista, mesmo o empregado sendo hipersuficientes.

Notas

1 CLT (https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm)

Art. 444 - As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.

Parágrafo único. A livre estipulação a que se refere o caput deste artigo aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A desta Consolidação, com a mesma eficácia legal e preponderância sobre os instrumentos coletivos, no caso de empregado portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.

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